terça-feira, 20 de abril de 2021

Turvo.




Eu vomito pela minha boca e ouvidos o líquido da Arte presa que não exagua. Eu vomito meus sofrimentos, lembranças, e sonhos. Daqui desaguam todos os rios, todos os caminhos. Sou quimera, sou tudo e todos. Sou aquilo que gostaria de ser e não pode, sou o grito encurralado do cavalo no pasto, sou o fumegar das correntes balançadas afoitas ávidas por um breve esfriar de suas usadas, açoitadas e atritas correntes. Sou a fumaça do ferro incandescente que recebe o banho de água gélida, sou o grito daqueles que se foram e não se foram. Sou a visão longínqua de uma realidade em chamas, sou a mente impossível de uma loucura real. Sou o arco-íris que desbrocha no fim da paisagem, logínqua e que quase não se vê. Sou a fumaça que se espraia por entre as folhas, e se perde na sua visão. Sou o pequeno aquele que jamais se consegue notar, e que está ali fazendo a mágica do seu trabalho. Sou o grande monumental que causa estragos, e que tem uma função vital por onde passa. Sou a tempestade revolta que solta raios e trovões, destrói o passado e as lembranças encardidas, sou os móveis secos pela limpeza constante, sou a madeira quebradiça e seca dos desejos de vida. Sou o ardil do álcool que queimou em nossa história, sou tudo aquilo que não pude ser e viver. Sou tudo, sou a mãe das águas, da terra e dos ares. Sou a quimera dos corações sofridos. Sou um só povo que clama por salvação. Sou a energia pulsante que me carrega e me impede a se reinventar, a chama transmutada de constante transformação. Sou tudo aquilo que é e pode ser. Sou a força da natureza e todos seus intemperes, e a calmaria das paisagens paradisíacas. Sou o trevo que se entremeia pelo cimento, sou a planta que chora pedindo secura, sou as flores que resistem ao vazio. Sou o sol que brilha todo dia, e que dele mesmo um dia fará seu fim.